Tive a felicidade de não
nascer em berço de ouro, e digo isso porque tive a alegria de nascer em uma
família de ouro, nascidos de uma terra de ouro: o interior pernambucano,
cidadezinha de Palmerina – PE Sitio de Baixa Grande.
Pais pernambucanos,
trabalhadores, semianalfabetos, resultado da exclusão educacional que o País
acompanhou por muitos anos. Ser analfabeto não quer dizer que a pessoa não
tenha capacidade cognitiva e inteligência para saber discernir o certo e o
errado. Meus pais trabalharam muito, e não deixaram seus quatro filhos trabalharem,
pois sabiam que o que os filhos deveriam fazer era estudar.
Meu pai assumiu nossa casa
sozinho, após minha mãe falecer, deixando o filho caçula (eu) com apenas 7 anos
de idade, no ano de 1988. Neste momento sua capacidade e grandeza floresceu de
forma ainda mais contundente. Trabalhou quase todos os dias das 7:00 às 22:00,
ao fim de cada semana, reunia os 4 filhos, para juntos planejarmos os próximos
passos, reunião de família secretariada pela minha irmã que anotava todas as
providencias a serem tomadas.
Eu não sabia muito bem o que
tudo aquilo significava, mas aos poucos meu pai me ensinava o que era a
sociedade, e na sua negação em levar seus filhos para trabalhar com ele na
construção civil (pedreiro), ele reafirmava a luta de classes, que eu viria a
aprender mais tarde na teoria o que na prática ele já me ensinava.
Por diversas vezes eu
presenciei meu pai debatendo com os donos das casas que ele construía que a
única diferença entre eles (meu pai e o proprietário da obra) era a educação e
o diploma que ele possuía na parede, pois inteligência meu pai sempre teve de
sobra.
Depois de percorrer um longo
caminho, militar no movimento estudantil por anos, ser filiado ao Partido
Socialista Brasileiro por 12 anos, secretário de finanças do mesmo e estudar
para me tornar um cientista social, fico impressionado como ainda produzimos em
nossa sociedade, pessoas, seres, cidadãos com um comportamento raso,
superficial, e que não procuram ao menos pesquisar antes de rotular, emitir
opiniões sobre situações, pessoas, e acontecimentos de toda ordem, político,
cultural e social sobre tudo.
As manifestações
preconceituosas contra os nordestinos que estão surgindo na internet são
desprovidas de qualquer racionalidade, lógica, e tem uma origem na mais
completa ignorância que pode surgir daqueles que não conhecem minimamente o seu
País e sua formação.
Afirmo a ignorância dos que
afirmam tais coisas, pelo fato de eu mesmo conhecer o povo nordestino, baianos,
alagoanos, pernambucanos, cearenses. Milito com vários desses irmãos,
brasileiros e que lutam por um Brasil melhor. Inclusive creio ser o nordeste
uma das regiões mais politizadas do País, e afirmo isso com a convicção de quem
visitou e debateu política com os mais diversos quadros formados nesta região
rica do Brasil.
Quando me refiro a
ignorância e desconhecimento sobre a formação do Brasil e de sua história é na
certeza de que muitos dos que falam que o povo nordestino é “ignorante”, entre
outros adjetivos sem o menos cabimento, parecem desconhecer que é o nordeste
uma das maiores fontes de conhecimento sobre o Brasil e tudo aquilo que você
conhece de País. Vamos lá, no Maranhão nasceu: Ferreira Gullart, Aluisio
Azevedo, Gonçalves Dias, Josué Montello, José Loureiro, Arthur Azevedo,
escritores e pensadores dos quais as faculdades do sudeste e de todo o País se
utilizam. Mas não vamos parar por aqui, na Bahia Jorge Amado, Milton Santos;
nas Alagoas, Graciliano Ramos, Aurélio Buarque de Holanda; na Paraíba, José
Lins do Rêgo, Ariano Suassuna, Celso Furtado; já no Ceará Raquel de Queiroz e José
de Alencar; em Pernambuco nasceu Paulo Freire, Gilberto Freire, João Cabral de
Melo Neto e Manuel Bandeira.
Diante de tantos motivos
para agradecermos a beleza do povo nordestino, se você ainda insiste em manter
seu preconceito tolo, demonstre ser esse completo ignorante, mas por favor não
beba nessas fontes de conhecimento, pois os mesmos não merecem ser ultrajados
desta forma, pois eles são parte da formação do nosso povo e da nossa
inteligência, eles não queriam de forma alguma deformar, degenerar e promover a
ignorância coletiva. Seja autentico e não diga que gosta de escritores,
pensadores, cientistas, políticos, sociólogos, economistas, que foram nascidos
e forjados no nordeste. Seja autentico, se forme apenas com o pensamento dos
autores nascido no sul e sudeste do País. Tenho uma pequena desconfiança, você
não vai lograr sucesso, se assim o fizer. Então respeite a diversidade e
multiplicidade cultural do nosso povo.
Dalmo Viana – Sociólogo e
militante político.